警訊133期 Revista da P.S.P. 133

56 Graças aos resul tados avul tados da invest igação científica nesta matéria, conhecemos o processo misterioso da prática da atenção plena. Em primeiro lugar, temos de perceber que a prática da atenção plena é um processo gradual, pelo que, não se tratando de alcançar uma meta, nem todos chegam ao mesmo patamar. A atenção plena faz parte do sétimo aspecto do Nobre Caminho Óctuplo do Budismo (compreensão correcta, pensamento correcto, fala correcta, acção correcta, meio de vida correcto, esforço correcto, atenção correcta, concentração correcta). Todavia, para conseguir chegar ao sétimo caminho, há que ter calcorreado no oitavo – concentração correcta. Concentração é a capacidade de dirigir a atenção dispersa para o momento presente, como um holofote, e o destinatário da atenção geralmente é a respiração, um objecto ou uma imagem. Contudo, qualquer pessoa que tenha meditado sabe que não é fácil sentar-se sossegadamente e concentrar-se. Se pensarmos bem, apercebemo-nos de que no quotidiano é raro dirigirmos 100% da nossa atenção para o momento presente, pois o mais provável é termos os pensamentos vagueantes sem nenhum destino concreto. Na verdade, o nosso cérebro nunca descansa, mesmo quando estamos ociosos ou nas nuvens, diferentes regiões cerebrais continuam activas, a trocar sinais, formando a conexão, entre estas regiões cerebrais, uma rede de modo padrão (default mode network, DMN). Sabemos pela ressonância magnética que as actividades mentais que reagem à DMN são as introspecções, as memórias autobiográficas (autobiographic memory) e os planos relativos ao futuro. O cérebro é o órgão que mais despende energia, pois surpreendentemente a DMN consome 60-80% da energia do cérebro e quando nos focamos seriamente numa tarefa, apenas gastamos mais 5% da energia, o que demonstra que no dia-adia despendemos a maior parte do tempo e energia a devanear, a lembrar coisas passadas ou a matutar em acontecimentos futuros. De uma forma geral, quando nos concentramos numa tarefa com propósito, a DMN é temporariamente inibida e a região cerebral responsável para dar seguimento à tarefa entra em acção. Os estudos científicos revelam que muitas doenças do foro psicológico derivam da inibição da DMN. Quando os pacientes que sofrem de esquizofrenia realizam exercícios de treino cognitivo, não se verifica uma redução da actividade da DMN do seu cérebro, o que revela que a sua mente saltita de um lado para o outro e disassocia-se da realidade. Por outro lado, nos pacientes que sofrem de depressão, a DMN do seu cérebro é hiperactiva (hyperactivation), o que demonstra que passam demasiado tempo em ruminações (rumination) e a focarem-se em si próprios (self-focus), sendo sinais distintos da depressão. Na verdade, os que conseguem melhor controlar o rumo dos pensamentos, tornam maior a sua capacidade de concentração, e nesta reside a chave da saúde mental. Por outro lado, o estado meditativo que exige elevada concentração, tranqui l idade e consciência corresponde ao concei to de “fluir” (flow) da Psicologia Positiva. Os estudos revelam que a concentração, de forma plena e consciente, na tarefa do momento presente, aumenta o bem-estar e a sensação de felicidade nas pessoas. A prática da atenção plena assenta precisamente no treino da concentração e na abstracção do que acontece ao redor, ajudando, a prática repetida do estado meditativo na criação de hábitos que podem ser aplicados na vida quotidiana para equilibrar o corpo e a mente, o que, em última instância, melhora a saúde física, mental, bem como a qualidade de vida. O primeiro passo na meditação consiste em olharmos para dentro, fixarmos o olhar no coração. No entanto, a meditação na atenção plena não consiste apenas em observar e sentir o que se passa no momento, pois o essencial é centrarse a atenção no nosso interior. E quem é afinal o destinatário da atenção? As escrituras “Samyuktagama” referem que durante a meditação devemos contemplar três aspectos (sofrimento, impermanência, inexistência do eu), pois a observação contínua deles ajuda as pessoas a distanciarem-se do sofrimento e aproximarem-se da felicidade, reduzindo assim os conflitos interiores. A contemplação do primeiro aspecto, “sofrimento”, conduz-nos à questão da origem do sofrimento que reside nas condicionantes inerentes à natureza humana; cobiçamos situações que nos favorecem, abominamos as adversidades e estamos à mercê dessas emoções de forma inconsciente. Se os nossos sentimentos se subordinam aos acontecimentos externos em constante mutação, é natural que fiquemos inquietos, ansiosos e não durmamos tranquilos. O objectivo da contemplação do “sofrimento” é a compreensão da proveniência do sofrimento e da alegria. Através da observação à distância, como numa vista panorâmica, vemos o jogo da alternância entre o sofrimento e a alegria, o início e o fim e, por conseguinte, percebemos também a existência da “impermanência”. Todos os seres vivos passam pela fase da formação, existência, desintegração e vacuidade, não havendo nada que seja imutável ou eterno, incluindo os bens materiais, a fortuna, a juventude, as relações humanas. Todavia, a “impermanência” não implica inegavelmente o sofrimento, antes pelo contrário, ao compreendê-la, sabemos que tudo faz parte do processo humano, todos os dias convivemos com a perda e o ganho. As emoções positivas desvanecem a qualquer momento e as emoções negativas não duram para sempre. Destarte, é possível viver a vida de forma calma e impassível, quando obtemos algo do nosso agrado; não fiquemos ansiosos com a sua eventual perda e quando perdemos algo estimável, não fiquemos transtornados, antes sejamos viajantes descontraídos na nossa própria jornada da vida. De acordo com alguns estudos clínicos, a inclusão do conceito de “impermanência da vida” no aconselhamento psicológico em situações de

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